#26 abas infinitas - Make good art e outros conteúdos inspiradores
1 - "São raras as pessoas que sabem que existem para contemplar o céu"
Ainda não li Ioga, de Emmanuel Carrère, mas já vi muitas indicações. O que me empolgou a querer lê-lo foi essa citação retirada da newsletter Queria ser grande, mas desisti da Bárbara Bom Angelo:
"A maioria pensa que existe sobre a terra para encontrar o amor, ficar rico, exercer algum poder, gerar picos de crescimento ou deixar sua marca nas areias do tempo. São raras as pessoas que sabem que existem para contemplar o céu. Se você não está nesse grupo, é uma sorte conhecer alguém que esteja. Isso amplia o horizonte. Eu tenho essa sorte: conheço Hervé, homem pacato, lacônico, absorto, que vive como se pudesse morrer a qualquer momento e tem sempre medo de acumular demais. […] Quando está viajando, ele arranca e joga fora as páginas dos livros assim que as lê, para ficar mais leve. Jornalista na Agence France Presse, morou na Espanha, na Holanda, no Paquistão, tendo o cuidado de não fazer carreira e continuar, como ele diz, abaixo do alcance do radar".
2- ‘Mais longa é a vida que contém a maior quantidade de alegrias apagadoras de tempo”
Esse relato da Carol Bensimon em sua newsletter sobre imersões diárias em um rio congelante na Califórnia.
"Há um grupo de mulheres que entra no rio quase todos os dias. A inspiração veio de Anita, uma mulher de 86 anos que já vinha fazendo isso há muito tempo, só de maiô. As nadadoras compraram roupas térmicas, ponchos forrados para a saída. O grupo se tornou uma comunidade bonita que se encontra para celebrar a vida, a relação com esse estuário, que assa cupcakes e brownies e come de pé gargalhando, as mulheres encostadas em seus Subarus e vans, seus cabelos brancos compridos cheios de sal. A idade média deve ficar pelo sessenta, e falar agora nesse texto sobre etarismo seria matar essa imagem, que é a de uma vida normal, essas professoras e enfermeiras e aposentadas, uma vida que pode existir sem a gritaria das redes sociais, submergir na água gelada, se divertir com as outras, fazer o inesperado."
3- "Se você quer que outros o sigam, aprenda a ficar sozinho com seus pensamentos"
Esse artigo que veio de uma palestra de William Deresiewicz chamada "Solitude and Leadership".
O artigo discute a importância da solidão para o desenvolvimento de líderes eficazes. Deresiewicz argumenta que, na era da conectividade constante, a solidão é vista como algo a ser evitado, quando na verdade é fundamental para a reflexão, introspecção e criação de uma visão clara e autêntica. Ele defende que a solidão permite que os líderes cultivem a capacidade de pensar por si mesmos, em vez de serem influenciados pelas opiniões dos outros. O autor também discute a importância de aprender a estar sozinho para poder lidar com o isolamento e a pressão que muitas vezes acompanham a liderança. No final, Deresiewicz conclui que a solidão não é um luxo para líderes, mas sim uma necessidade para o desenvolvimento da liderança verdadeira e eficaz.
Ao passar muito tempo nas redes sociais, acorrentado ao ciclo de notícias, diz ele, ‘você é mergulhado na sabedoria convencional, marinado na realidade dos outros: para os outros, não para você mesmo. Você está criando uma cacofonia na qual é impossível ouvir sua própria voz, esteja você pensando em si ou em qualquer outra coisa.”
4 - "You belong in the most secret part of you"
Eu adoro conteúdos que incentivam o desbloqueio criativo (por que será?) e essa carta do artista Sol LeWitt’s para a escritora Eva Hesse escrita em 1965 foi tipo uma viagem no tempo que abriu minha mente.
"Learn to say “Fuck You” to the world once in a while. You have every right to. Just stop thinking, worrying, looking over your shoulder, wondering, doubting, fearing, hurting, hoping for some easy way out, struggling, grasping, confusing, itching, scratching, mumbling, bumbling, grumbling, humbling, stumbling, numbling, rambling, gambling, tumbling, scumbling, scrambling, hitching, hatching, bitching, moaning, groaning, honing, boning, horse-shitting, hair-splitting, nit-picking, piss-trickling, nose sticking, ass-gouging, eyeball-poking, finger-pointing, alleyway-sneaking, long waiting, small stepping, evil-eyeing, back-scratching, searching, perching, besmirching, grinding, grinding, grinding away at yourself. Stop it and just DO"
traduzindo:
Aprenda a dizer "Foda-se" para o mundo de vez em quando. Você tem todo o direito. Apenas pare de pensar, se preocupar, olhar por cima do ombro, se perguntar, duvidar, ter medo, se machucar, esperar por uma solução fácil, lutar, agarrar, confundir, coçar, resmungar, tropeçar, cambalear, gaguejar, se humilhar, se enredar, se precipitar, se agarrar, se coçar, se esfregar, se atrapalhar, esperar por muito tempo, dar passos pequenos, olhar maliciosamente, coçar as costas, procurar, empoleirar-se, difamar, moer, moer, moer a si mesmo. Pare com isso e simplesmente FAÇA.
Mais um trechinho:
From your description, and from what I know of your previous work and your ability; the work you are doing sounds very good “Drawing — clean — clear but crazy like machines, larger and bolder… real nonsense.” That sounds fine, wonderful — real nonsense. Do more. More nonsensical, more crazy, more machines, more breasts, penises, cunts, whatever — make them abound with nonsense. Try and tickle something inside you, your “weird humor.” You belong in the most secret part of you. Don’t worry about cool, make your own uncool. Make your own, your own world. If you fear, make it work for you — draw & paint your fear & anxiety. And stop worrying about big, deep things such as “to decide on a purpose and way of life, a consistant [sic] approach to even some impossible end or even an imagined end.” You must practice being stupid, dumb, unthinking, empty. Then you will be able to DO
traduzindo:
Pela sua descrição e pelo que eu sei do seu trabalho anterior e da sua habilidade, o trabalho que você está fazendo parece muito bom: "Desenhar - limpo - claro, mas louco como máquinas, maior e mais ousado... real nonsense". Isso parece ótimo, maravilhoso - real nonsense. Faça mais. Mais sem sentido, mais louco, mais máquinas, mais seios, pênis, vaginas, seja lá o que for - faça-os transbordar de nonsense. Tente provocar algo dentro de você, seu "humor estranho". Você pertence à parte mais secreta de si mesmo. Não se preocupe em ser legal, crie o seu próprio uncool. Crie o seu próprio mundo. Se você tem medo, faça isso funcionar a seu favor - desenhe e pinte seu medo e ansiedade. E pare de se preocupar com coisas grandes e profundas como "decidir um propósito e uma forma de vida, uma abordagem consistente para um fim impossível ou mesmo imaginário". Você deve praticar ser estúpido, burro, sem pensamentos, vazio. Então você será capaz de FAZER.
Tá bom, o último trechinho:
"I have much confidence in you and even though you are tormenting yourself, the work you do is very good. Try to do some BAD work — the worst you can think of and see what happens but mainly relax and let everything go to hell — you are not responsible for the world — you are only responsible for your work — so DO IT. And don’t think that your work has to conform to any preconceived form, idea or flavor. It can be anything you want it to be. But if life would be easier for you if you stopped working — then stop. Don’t punish yourself. However, I think that it is so deeply engrained in you that it would be easier to DO"
traduzindo:
Eu tenho muita confiança em você e, mesmo que você esteja se atormentando, o trabalho que você faz é muito bom. Tente fazer um trabalho RUIM - o pior que você puder pensar - e veja o que acontece, mas principalmente relaxe e deixe tudo ir para o inferno - você não é responsável pelo mundo - você é responsável apenas pelo seu trabalho - então FAÇA-O. E não pense que seu trabalho precisa se conformar a qualquer forma, ideia ou sabor preconcebido. Pode ser qualquer coisa que você queira que seja. Mas se a vida seria mais fácil para você se parasse de trabalhar - então pare. Não se puna. No entanto, eu acho que isso está tão profundamente enraizado em você que seria mais fácil FAZER.
5 - Mundos Virtuais
E seguindo esse conselho de fazer sua arte, meio que sem querer, criei um perfil novo no Instagram, com imagens geradas por Inteligência Artificial. É o @mundosvirtuais. Essa é minha parte secreta, algo que evoca meu senso de humor estranho, meu jeito diferente de ver o mundo. Me divirto imaginando velhinhas indianas andando de skate. Tem alguma utilidade para o mundo? Talvez não, mas gasto uma parte do dia viajando por essas imagens e pensando no mundo que está por vir.
6 - "Você vai morrer, então não desperdice tempo"
Eu sempre volto a Sêneca em momentos de desesperança, e aos estoicos em geral, e geralmente funciona. Neste link, o autor reuniu quatro lições de Sêneca para uma vida boa.
"Não temos exatamente uma vida curta, mas desperdiçamos uma grande parte dela. A vida, se bem empregada, é suficientemente longa e nos foi dada com muita generosidade para a realização de importantes tarefas. Ao contrário, desperdiçada no luxo e na indiferença, se nenhuma obra é concretizada, por fim, se não se respeita nenhum valor, não realizamos aquilo que deveríamos realizar, sentimos que ela realmente se esvai. Desse modo, não temos uma vida breve, mas fazemos com que seja assim".
7 - Make Good Art
Talvez um dos discursos de formatura mais famosos, essa fala do Neil Gaiman sempre mexe comigo, porque ela tem um "Call to action" muito forte: "Make good art". Ele fez esse discurso para alunos de uma universidade de artes em 2012, então ele é muito focado no processo criativo e na importância de seguir o instinto para continuar criando, mesmo sem receber feedbacks positivos, dinheiro ou qualquer outro estímulo.
Aqui tem as principais lições desse discurso, mas se você nunca viu, vale a pena clicar neste link.
Alguns dos meus trechos favoritos:
"I decided that I would do my best in future not to write books just for the money. If you didn’t get the money, then you didn’t have anything. If I did work I was proud of, and I didn’t get the money, at least I’d have the work".
"People keep working, in a freelance world, and more and more of today’s world is freelance, because their work is good, and because they are easy to get along with, and because they deliver the work on time. And you don’t even need all three. Two out of three is fine. People will tolerate how unpleasant you are if your work is good and you deliver it on time. They’ll forgive the lateness of the work if it’s good, and if they like you. And you don’t have to be as good as the others if you’re on time and it’s always a pleasure to hear from you".
And now go, and make interesting mistakes, make amazing mistakes, make glorious and fantastic mistakes. Break rules. Leave the world more interesting for your being here. Make good art.
traduzindo:
Decidi que no futuro, farei o meu melhor para não escrever livros apenas por dinheiro. Se você não recebia o dinheiro, então não tinha nada. Se eu fizesse um trabalho do qual me orgulhasse e não recebesse dinheiro, pelo menos teria o trabalho.
As pessoas continuam trabalhando no mundo freelance, e cada vez mais o mundo atual é freelance, porque seu trabalho é bom, porque são fáceis de lidar e porque entregam o trabalho no prazo. E você nem precisa dos três. Dois de três está bom. As pessoas tolerarão o quão desagradável você é se o seu trabalho for bom e você entregá-lo no prazo. Elas vão perdoar a demora do trabalho se for bom e se gostarem de você. E você não precisa ser tão bom quanto os outros se estiver no prazo e for sempre um prazer ouvir de você.
Agora vá e cometa erros interessantes, erros incríveis, erros gloriosos e fantásticos. Quebre as regras. Deixe o mundo mais interessante por ter estado aqui. Faça boa arte.
8 - Seja um bom assistente para você mesmo
Toda vez que sento para escrever, passo alguns minutos escrevendo sobre o quanto eu preciso escrever mais. É a minha mídia, é de onde sai a minha expressão, mas por algum motivo besta, provavelmente auto-boicote, acabo nunca escrevendo.
Um dos caras que mais me inspiram sobre "journaling", que é o famoso escrever no diário, é o Austin Kleon. Sua newsletter é muito legal e ele está sempre produzindo conteúdo sobre a importância de escrever no papel.
Quando eu pego algo que escrevi há 10 anos, eu acho surpreendentemente atual. Eu ainda estou pensando nas mesmas coisas. Mostra os ciclos e padrões da minha vida. Será que eu não evolui, ou será que esses questionamentos fazem parte da minha essência? Taí uma das coisas mágicas de se escrever no papel, é como se fosse uma carta dentro da garrafa, uma espécie de telepatia com você mesmo. E se alguém, depois que eu morrer, for ler todos esses meus conflitos, não há mais porque ter vergonha. É até uma forma de continuar existindo, como eu fui, como eu sou.
"Be a good assistant to yourself. Prepare and gather, make notations and sketches in your head or phone. When you work, all that mapping, architecture, research & preparation will be your past self giving a gift to the future self that you are now. That is the sacred".
Jerry Saltz
traduzindo:
"Seja um bom assistente para si mesmo. Prepare e reúna informações, faça anotações e esboços em sua mente ou celular. Quando você trabalha, todo esse mapeamento, arquitetura, pesquisa e preparação serão seu eu passado dando um presente para o eu futuro que você é agora. Isso é sagrado".
9 - Lofi the way out of the world
Uma das formas que encontrei para me concentrar quando há barulho em volta ou quando o barulho está aqui dentro, é ligar o Lo-fi, um canal do You Tube que fica passando músicas relaxantes para estudar ou se concentrar. É um dos canais que está ao vivo há mais tempo no You Tube, e (quase) nunca sai do ar. Nos comentários, você compartilha o sentimento de estar online com uma comunidade inteira. Eu disse quase nunca sai do ar porque recentemente eles pausaram a transmissão para um lançamento secreto. Era o lançamento do Synthwave Boy, um garoto que ouve música eletrônica lo-fi enquanto mexe no computador ao lado de seu gatinho.
10 - Don't be afraid do disappear
E já que estamos falando de criar uma boa arte, impossível não lembrar do discurso da Michaela Coel, criadora da série I May Destroy You (HBO) quando foi receber um Emmy. Ela destacou algo muito importante para o trabalho artístico: ter a coragem de desaparecer para poder se dedicar realmente a criar uma arte. Vale a pena ver o discurso na íntegra aqui.
“Write the tale that scares you, that makes you feel uncertain, that is uncomfortable. I dare you. In a world that entices us to browse through the lives of others to help us better determine how we feel about ourselves, and to, in turn, feel the need to be constantly visible, for visibility these days seems to somehow equate to success, do not be afraid to disappear, from it, from us, for a while, and see what comes to you in the silence.”
"Escreva a história que te assusta, que te faz sentir incerta, que é desconfortável. Eu te desafio. Em um mundo que nos tenta a navegar pelas vidas dos outros para nos ajudar a determinar como nos sentimos em relação a nós mesmos, e a sentir a necessidade de estar constantemente visível, pois a visibilidade hoje em dia parece de alguma forma se equiparar ao sucesso, não tenha medo de desaparecer, dele, de nós, por um tempo, e veja o que vem até você no silêncio."
Até a próxima!