#4 Abas Infinitas - Pelo menos ainda existem as férias
Os parquinhos estão interditados, mas os restaurantes e os shoppings estão de boa
2020 insiste em continuar como ano. O Pantanal queima. O Bolsonaro mente na ONU e quase mil pessoas continuam morrendo por dia. Os meses vão passando. Mas ainda existe uma instituição chamada férias.
Não subestime seu poder. Ela parece banal às vezes, mas não é. No começo, dizemos aos nossos colegas que logo vamos voltar. São poucos dias, nem vai dar pra desligar muito. Mas quando você recebe o aval para sair do grupo de whatsapp do trabalho, é ali que as férias começam, amigo.
Dizem que quando você marca uma data, ela chega. As férias chegaram e nada conseguiu impedir que eu simplesmente pudesse desligar o computador e sair andando. Tá, não foi literalmente assim, mas seria legal se tivesse sido. Pelo menos eu pude parar de andar pela casa usando fones de ouvido sem fio.
Minha vida se resumiu nos últimos meses a estar a um braço de distância de um aparelho eletrônico durante todo o tempo em que estava acordada. É como se eu estivesse algemada ao meu celular. Agora, eu estava livre.
As férias são, antes de tudo, um estado de espírito. Eu as considero como um calendário a parte, onde me permito não fazer nada chato como acompanhar os e-mails ou trocar uma senha. Evito até pagar contas, resolver problemas antigos. Por mais que às vezes seja tentador agendar aquele exame ou pedir a segunda via do documento no Poupatempo, tento evitar fazer isso comigo nas férias.
Esse ano, decidi que ia entrar no estado de espírito o mais rápido possível. Não há tempo de relaxamento a perder. Fiquei de bom humor imediatamente assim que acabou a última reunião e me permiti pedir um sanduíche de pastrami do Z.Deli no delivery.
Isso não significa que tenha sido fácil. Foi toda uma descoberta de limites, tirar férias em uma pandemia. Não se pode simplesmente pegar um avião tranquilo (nem mesmo o carro), não se pode ir a um restaurante sem se sentir noiado (nem mesmo pedir um delivery), não se pode marcar uma cerveja com os amigos (nem mesmo ver os familiares). Estamos o tempo todo cercados pelo medo da Covid. Essa doença acaba ensinando a gente a respeitar os limites, pesar o que é mais importante e esperar menos das coisas. Talvez depois dessa doença role o maior carnaval de todos os tempos, ou quem sabe as melhores férias de todos os tempos.
Alguns pensamentos tontos das férias:
Algumas conchas são iguaizinhas a uma onda
É preciso fazer exercício físico todos os dias (eu disse todos)
A piscina é uma ótima desculpa para se andar seminu em público
Por que somos contra os pernilongos se o ato de coçar é tão gostoso?
Tem alguns lugares em São Paulo que não compensa ir nem uma vez por ano
Quanto mais rápido você enfrentar a louça, mais boazinha ela será com você
Preciso de razões melhores para explicar por que gosto de dinossauros, mas não de lagartos
Ver o mar apenas uma vez ao ano é pouco
Quem cruza a máscara na orelha é meio fashion (?)
O mundo com distanciamento das cadeiras é chato d+
Estamos realmente vivendo ou apenas respondendo ao whatsapp?
Dez coisas que eu fiz nas férias:
Joguei ping pong (meu saque precisa de mais treino)
Colei figurinhas em um álbum
Mantive o exercício físico
Observei uma girafa de pertinho
Cruzei um rio a nado
Fiz o exame de cotonete de Covid
Entrei em uma piscina de bolinhas
Usei roupas que estavam esquecidas no armário
Tentei continuar com o desbloqueio criativo
Assisti a muitas séries
Dez coisas que eu queria ter feito nas férias e não deu (fica pra próxima):
Escrever mais (sempre, a resistência)
Tirar uma foto boa pra trocar a do perfil
Preparar um tiramisu
Fazer exames periódicos
Tirar o RG do meu filho no Poupatempo
Nadar em uma piscina olímpica
Assistir ao documentário O Dilema das Redes (The Social Dilemma)
Ler as revistas atrasadas
Comer comida coreana
Esquecer a senha do computador e do e-mail profissional
Algumas dicas de coisas legais:
Hip Hop Evolution (Netflix)
Quando o dia acaba, está na hora da aula da pós. No meu caso, a pós é na história do hip-hop. Essa série é fenomenal, produzida pelo músico canadense Shad, ela reúne relatos históricos e entrevistas sobre como surgiu a arte de colocar rimas em cima de batidas. Ele entrevista o primeiro DJ que fazia umas festas no Bronx e misturava samples de outras músicas. Sem saber, ele deu início a toda uma cultura que hoje já virou extremamente mainstream. Descobri músicas históricas que eu nem sabia que existia como The Message, Christmas Rappin', 6'n the mornin', Ladies First. Se você curte minimamente rap ou hip hop, ou ainda que seja a história da música, vale muito a pena assistir.
DJONGA - O menino que queria ser Deus (CD)
Nessa onda do hip hop e também do tempo livre, pude ouvir algumas vezes esse álbum inteiro, e foi muito bom mergulhar na obra do Djonga, um rapper já super premiado e considerado. O primeiro contato que eu tinha tido com a música dele foi ao ver o clipe Junho de 94. Além de uma bomba musical, é também uma bomba audiovisual. Essa música também está no álbum “O menino que queria ser Deus”. Gosto muito também da música UFA. Esse álbum é de 2018, mais recentemente, Djonga lançou com o rapper Dexter uma versão do hit histórico Voz Ativa dos Racionais MCs (que ficou bem legal também).
Você precisa de uma solução ou de empatia? (link)
Não sei bem como essa entrevista da professora de psicologia Lisa Feldman Barrett caiu nas minhas abas infinitas, mas serviu como uma luva. Eu tendo a me tornar facilmente uma máquina de resolver problemas no dia-a-dia, pois eles são muitos e se acumulam, mas esqueço que nem sempre as pessoas só querem a solução para o problema. Muitas vezes a pessoa quer cuidado, carinho, compreensão ou só um ouvido amigo. Por isso, foi interessante ouvir que antes de dar uma solução, é preciso entender o que o outro precisa (e quer). Acho que isso pode ajudar nas relações, achei interessante.
Euphoria (HBO) (trailer)
A Zendaya se tornou a mais jovem a levar um Emmy de melhor atriz de drama com 24 anos e esse é um bom momento para indicar a série Euphoria. Ela foi um hit quando foi lançada, no ano passado. É uma série bem jovem, onde você acompanha personagens complexos buscando descobrir quem eles são, que tipo de adultos querem ser. Não dá pra contar muito sem estragar a trama, mas pode esperar muito drama, crocodilagens e ótimas maquiagens. É uma das melhores séries feitas recentemente, com certeza. E parece que vai ter uma segunda temporada pós-pandemia. Oremos.
Sal Gordura Ácido Calor (Livro)
Eu tinha visto o primeiro capítulo dessa série na Netflix e me interessei pelas técnicas de culinária que a Samin Nosrat explora. Acabei não vendo os outros episódios, mas depois de ver ela falar sobre salgar a carne logo que se chega do açougue, nunca mais comi bife do mesmo jeito. Ela explica que o sal incorpora na carne e quanto mais tempo ela permanecer salgando, mais suculento será o bife. Por acreditar nisso firmemente, comi muitos bifes salgados erroneamente até acertar a quantidade de sal e o tempo máximo que ela pode ficar salgando. Acabei indo atrás do livro em que ela explica mais claramente sobre as técnicas básicas de culinária que envolvem salgar, controlar as gorduras etc. Me senti muito mais segura na cozinha depois de ler esse livro pois lembro sempre do que ela fala sobre aprimorar testando e também para provar a comida durante o processo todo. Dessa forma, você consegue entender o que está acontecendo na panela, e quais os efeitos que cada ação tem na comida. Ela fala até pra provar a cebola enquanto ela refoga, para entender qual o ponto exato entre dourar e queimar. Eu achei estranho, mas entendi a ideia principal que é: só se aprende a cozinhar testando e inventando. Cozinhar é uma forma de arte e qualquer ideia que leve à experimentação, está no caminho certo. Ah, e um dos principais triunfos do livro são as ilustrações da Wendy Macnaughton. Tem vários esquemas e receitas bem explicadinhas, um livro pra ser degustado devagar e usado pro resto da vida.
Succession (HBO) (trailer)
Eu evitava assistir a essa série, mas ao ver que levou vários prêmios Emmy novamente, resolvi dar uma chance, afinal, estava em casa sem fazer nada. A história conta a história da família à frente do quinto conglomerado de mídia do mundo. O pai, de 80 anos, evita se aposentar. O filho mais velho já está preparado para assumir o cargo de CEO, mas já no primeiro episódio a gente vê que o pai não é fácil de lidar. A primeira impressão que tive é que eu odiava todos os personagens e torcia para eles perderem a empresa e ficarem pobres pra ver se aprendiam alguma coisa. Com o tempo, fui me envolvendo na trama, mesmo concluindo que são todos meio psicopatas. Vale a pena ver, acho. Não sei bem, mas estou adorando odiar.
The Marvelous Mrs Maisel (Prime Video)
Essa série é bem inspiradora, principalmente se você for uma mulher interessada em humor e cultura judaica (bem específico). Tô brincando, ela é bem interessante para qualquer um, talvez mais para mulheres, mas enfim, é bem legal, bem leve. Conta a história da Miriam Maisel, conhecida como Mrs Maisel. Uma mulher dos anos 50 em Nova York que é abandonada pelo marido e se vê tendo que voltar para a casa dos pais com os dois filhos. Em momento algum ela sente pena de si mesma, pelo contrário, ela desabrocha depois que se separa, começa a trabalhar como vendedora em uma loja e se descobre como comediante stand-up. A série tem uma direção de arte impecável, tudo é bonito e esteticamente agradável (principalmente os vestidos e os chapéus) e é uma delícia acompanhar a trajetória da Midge rumo ao sucesso (ajudada pela sua divertida empresária Susie Myerson). Tem três temporadas e você zera rapidinho se estiver com tempo livre. É daquelas séries que você sente saudade dos personagens depois que acaba.
Steal Away - Robbie Dupree
Essa música tem a vibe de férias à beira-mar e roupas marinheiro. Não sei onde ela apareceu pra mim, mas sempre que a ouço fico good vibes.
Até a próxima!