# 35 Abas Infinitas - A Geração Alpha faz seus próprios memes e ninguém entende nada
Crescendo com todo o conteúdo do mundo à sua disposição, só resta fazer mashups e juntar coisas diferentes numa velocidade surpreendente
Deu na Business Insider que a geração Alpha já tem seus próprios memes e que os jovens da geração Z estão se sentindo desatualizados e velhos. Caso você não tenha entendido nenhuma palavra da frase anterior, a designação das gerações como "Alpha ou Z" é geralmente atribuída Às características e comportamentos de diferentes grupos etários ao longo do tempo. Esses termos ajudam a entender as tendências sociais, culturais e econômicas associadas a cada geração.
O ChatGPT me deu uma força aqui para explicar:
Baby Boomers: O termo foi popularizado após a Segunda Guerra Mundial, para descrever a grande geração nascida entre 1946 e 1964.
Geração X: Surgiu na década de 1960 e 1970, usada por autores e críticos culturais para descrever a geração nascida aproximadamente entre 1965 e 1980.
Millennials: O termo foi popularizado por Neil Howe e William Strauss em seu livro de 1991, "Generations". Eles identificaram os Millennials como a geração que chegaria à maioridade na virada do milênio. Muitos dos millenials nasceram antes da Internet, o que os torna uma geração de passagem entre o velho mundo e o novo mundo.
Gen Z: Segue naturalmente após os Millennials. O termo ganhou popularidade à medida que se tornava claro que essa era a primeira geração nascida com a Internet dominando o mundo e por isso eles têm uma relação diferente com a tecnologia e a mídia social.
Geração Alpha: O termo foi cunhado pelo futurista australiano Mark McCrindle. Ele escolheu "Alpha" para significar um novo começo do século XXI. Os pesquisadores e a mídia usam o começo do ano de 2012 (ou início de 2013) como o início desta geração e 2024 como o fim. Ou seja, quem nasce agora, já vai ser de outra geração.
Se você pensar bem, você poderia questionar essas gerações como questiona o horóscopo: não é porque você é de Touro que necessariamente gosta muito de comer, mas no caso das gerações, o fato de crescer vendo o mesmo conteúdo, vivendo os mesmos fatores externos, a mesma configuração de família da sua época, há uma enorme chance de você se tornar parecido com o seu grupo. É como dizem: somos fruto do tempo em que vivemos. Ninguém consegue ser muito mais diferente que isso por mais que tente.
À medida que os membros mais velhos da geração Alfa, nascidos por volta de 2010, se aproximam da adolescência, muitos passaram grande parte da sua infância on-line, compartilhando seus próprios memes, desenvolvendo suas próprias subculturas na Internet e deixando aqueles que estão no meio e no final da adolescência se sentindo 'velhos'.
Como disse um usuário do Reddit comentando a matéria sobre a Gen Z "se sentir velha": "quantas vezes as pessoas precisam ser lembradas de que o mais velho da Geração Alfa tem cerca de 10 anos? Apenas mostra o preconceito de idade desenfreado e bizarro da geração Z, pois como pensam seriamente que estão “fora de moda” quando literalmente cada pedaço de cultura é ditado e comercializado para eles?"
No meu caso, me encaixo na geração Millenial (ou geriatric millenial como algumas línguas malígnas já apontaram), então me sinto vingada pois tenho um representante da geração Alpha no sofá de casa e agora estou sabendo de tudo antes de todo mundo. Percebi que se eu sair um pouco da posição de mãe preocupada se devo proibir o You Tube e começar a prestar a atenção na cultura que ele consome, posso aprender muito sobre o mundo que será construído por pessoas e para pessoas da sua geração.
Geração do Mashup
A primeira coisa que me vem à mente é que essa é "a geração do Mashup". Como eles crescem em um mundo onde o acesso à internet é quase onipresente, essas crianças têm à sua disposição uma quantidade incomensurável de informações, vídeos, músicas, memes e outros conteúdos culturais e educativos. Este contexto cria um ambiente propício para a criação de mashups — a combinação de elementos de diferentes fontes para criar algo novo e original.
Plataformas como TikTok são um exemplo claro disso, onde trechos de músicas, cenas de filmes e séries são constantemente reutilizados e transformados em novos contextos. A rapidez com que novos memes surgem e se espalham é a prova de como o mashup é intuitivo pra Geração Alpha.
Como esse vídeo do Gustavo Paródias, que une uma cena do Touro Ferdinando, com um funk inventado com referências ao desenho dos Backyardigans, funk do Tubarão Te amo, e etc. e resulta num vídeo centenas de vezes mais engraçado que o original.
Me peguei pensando quem é o gênio por trás do Gustavo Paródias e descobri que são dois: Antony Gustavo Firmino da Rocha, 19, e Gleison Firmino da Rocha, 21, dois jovens de Girau do Ponciano, a 160 km da capital de Alagoas. “O processo [da produção de cada vídeo] é bem calculado e demorado. No roteiro, costumamos usar gírias e trazer a cultura nordestina, o que torna os vídeos mais engraçados. Na hora da dublagem, tentamos incorporar os personagens, para que a paródia soe bem natural e marcante. Também gostamos de colocar detalhes e muitas referências nos vídeos. Só nós dois damos conta de bolar e executar tudo”, afirmou Gleison ao G1.
E os memes que ninguém entende?
Skibidi Toilet
Eu demorei para perceber que além de ser mãe eu estava na verdade fazendo uma pós em cultura de Internet do século XXI. Um dia me peguei tendo que pesquisar Skibidi Toilet no Google mesmo sem saber como escrevia. Descobri que mais que um personagem bizarro, skibidi toilet está dentro do Roblox e outros jogos que também fazem mashup da cultura pop com seus conteúdos. Esse meme nada mais é que um homem dentro de um vaso sanitário cantando e assustando as pessoas. Descobri depois que ele passou a ter medo de ficar sozinho no banheiro. Seu criador, que atende pelo nome de usuário do YouTube "DaFuq!?Boom!" (belíssimo nome BTW), tem mais de 22,6 milhões de assinantes no YouTube, e a maioria de seus vídeos "Skibidi Toilet" tem entre 20 e 46 milhões de visualizações. Enquanto isso, sua conta no TikTok tem mais de 1,9 milhão de seguidores. Pesquisando mais, descobri que trata-se de uma série de vídeos com um exército cantor de homens dentro de vasos sanitários lutando com câmeras-pessoas, seja lá o que isso significa. Há até um termo cunhado, “síndrome do banheiro skibidi”, que é uma gíria para o dano cerebral que uma criança pode sofrer ao assistir demais. Lamentável.
Peppa doida
Parece que foi de uma hora para a outra que ele passou da fase de assistir a Peppa fofinha, para a Peppa doida ou "Peppa Pig da zueira", como muitos vídeos se chamam. Essa série de vídeos nada mais é que mashups entre cenas da Peppa com memes e falas mal educadas. A Peppa pode aparecer com os olhos estalados como se tivesse usado drogas (ou possuída por um ser malígno). No mar aberto da Internet, ser fofinho não dá Ibope, então as coisas ficam sempre mais violentas, sem narrativa ou contexto, mas sempre com muita ironia. Do nada, meu filho passou a conhecer memes como "No céu tem pão?" e passou a reconhecer a voz de Silvio Santos, Faustão e Alborghetti tudo através da Peppa doida. Nova TV que fala, né?
Coca-cola espumante
Começou numa festa de aniversário quando todas as crianças começaram a cantar "Coca cola espumante" toda vez que pegavam coca. Achei que era uma brincadeira que tinham acabado de inventar, mas só depois vi o áudio de Coca-cola espumante dentro do episódio da Peppa doida (mashups, lembra). Fui descobrir que é um vídeo de dez anos atrás com 1,2 milhão de visualizações e uma poesia sui generis. Pelos comentários dá para ver que tá tendo um movimento de volta ao vídeo, com muita gente revendo ou assistindo pela primeira vez.
Look, a birdie!
Guys Look A Birdie é um meme retirado de uma cena do desenho animado Os Jovens Titãs onde o Cyborg aponta pela janela para um pássaro seguido por ele e Robin correndo em direção a ele, e batendo na janela. A cena virou alvo de edições diversas no YouTube e no TikTok desde 2022. Aqui tem um compilado de mil releituras da cena.
Onde foram parar as cabeças?
Outra tendência que percebi é a desumanização das figuras e monstros que passaram a aparecer na minha televisão. Cadê o conteúdo dito infantil? No vale-tudo da internet, mesmo colocando filtros para idades é impossível evitar que seu filho veja conteúdos para 14, 16 anos, e é essa a expressão do momento. A morte da face, a vitória do terror. Tudo tem sempre um ar sombrio, de fim dos tempos (deve ser por que é né…). Tem o Siren Head que transmite suas mensagens misteriosas em alto-falantes de metal empoleirados em uma estrutura humanóide de madeira de doze metros de altura. Tem o Cameraman, os monstros do Doors, o próprio Roblox onde você pode até ficar sem cabeça ou com o corpo desfigurado - se estendendo aos filtros de TikTok onde você completa o ciclo e se desumaniza sozinho.
Mais desgraceira
Para mostrar mais alguns conteúdos completamente insanos da cabeça que não chegam a ser memes, mas que o YouTube acaba apresentando está o Sagawa, um homem que faz vídeos imitando outros vídeos da internet. O resultado é uma viagem pelo que acontece na internet em um longo VT cheio de cortes e estímulos rápidos. Não dá tempo de rir de um vídeo ou mesmo absorvê-lo, pois quando você vê, ele já tá trazendo outra coisa absurda. Meu filho o chama de "Hominho fofo", para meu desespero.
Tem também a explosão de refri com mentos, mas agora no modo esteróides 2024. Na mesma escola de Lucas Netto que encheu uma banheira com Nutella pagando com o dinheiro de vídeos da Internet para gerar uma explosão de views que renderia muito mais dinheiro de vídeos, criadores de conteúdo usam galões e galões de refrigerante, numa operação quase que do exército para explosão de bombas. Impressionante descobrir que existem galões de 5L de refrigerantes verdes ou azuis provavelmente nos Estados Unidos. A explosão final, se colocasse uma trilha sonora com música clássica (tipo Beleza Americana filmando o saquinho de supermercado), daria para colocar no museu.
Algumas coisas que vi nos últimos dias:
Let It Be e Get Back - documentários sobre os Beatles - Disney +
Soube por uma notícia no jornal (nada mais cringe que isso) que haveria o lançamento de um novo documentário sobre os Beatles. “Let It Be”, o filme original de 1970 do diretor Michael Lindsay-Hogg foi lançado no streaming Disney+. Lançado em meio ao turbilhão da separação dos Beatles, “Let It Be” agora ocupa o seu devido lugar na história da banda. Antes visto através de lentes mais escuras, o filme agora é trazido à luz por meio de sua restauração e no contexto das revelações trazidas pela série documental de Peter Jackson, vencedora de vários prêmios Emmy®, “The Beatles: Get Back”. Lançada na Disney+ em 2021, a série documental mostra o calor e a camaradagem do icônico quarteto, capturando um momento crucial na história da música.
Eu que não sou super fã da banda, gostei de saber mais como era a dinâmica entre eles, observar a genialidade de Paul McCartney e ver a Yoko Ono praticamente grudada em John Lennon em todas as cenas.
Ramones Raw
Na linha dos documentários de banda, pulamos para o Ramones Raw, um registro bem "cru" como diz o título da banda em turnê. Aqui tem o doc na íntegra com legenda em espanhol. O documentário usou mais de 5 horas de material raro abrangendo a carreira histórica dos Ramones (por volta de 1979-1996), a maior parte vista pela primeira vez nesse material. São imagens antigas de shows (filmadas em filme em 1980, arquivadas e quase esquecidas por mais de 20 anos), raras aparições na TV, cenas de bastidores e etc.
Triste pensar que todos já morreram, mas a potência da música está ao nosso alcance até hoje. Eu acho que música é uma das obras de arte mais poderosas que existem pois permanece emocionando pessoas por séculos de forma acessível.
Schumacher - Netflix
Ainda na onda dos documentários, esse foi o único filme aprovado pela família do Schumacher sobre sua vida e o acidente que o deixou debilitado. O doc traz entrevistas raras e imagens de arquivos nunca antes reveladas, para traçar um sensível perfil do homem que foi 7 vezes campeão mundial.
Ronaldo, O Fenômeno | Documentário Exclusivo Globoplay
E por falar em gênio do esporte, trago mais um documentário, dessa vez do Ronaldo. Produzido por uns gringos, ele reconta a história da Copa de 98 e sua volta em 2002. Olhando para esse passado recente, é possível se questionar se o Brasil foi justo com ele. Não se falava em saúde mental, muito menos se autoquestionava sobre o bullying coletivo de uma nação. Sai deste filme concluindo que ele foi gigante emocionalmente e um jogador virtuoso.
Transmissão em tempo real do sofrimento
É mais triste do que qualquer coisa, mas descobri esse cara que faz o live blogging de sua dependência de metanfetamina e outras drogas. Neste vídeo, ele conta que está há 4 dias acordado e com feridas no rosto que ele mesmo causou. Esse vídeo me fez pensar na época em que vivemos, em que tudo vira conteúdo, e pode até ajudar pessoas, mas também pode ser gatilho para outras. Aqui ele fala sobre o efeito de cada uma das drogas. Deveria haver um limite para o que é produzido e postado, mas quem é que define? No jornalismo esse tipo de discussão é comum: que tipos de conteúdo são de interesse público e o que é de interesse DO público? Ou ainda: que tipo de efeito isso pode ter na audiência? Me lembrei de uma frase do diretor do Center for Humane Technology (algo como "Centro pela Tecnologia Humana") Tristan Harris em um artigo no The New York Times: "Nossos cérebros paleolíticos não foram construídos para a consciência onisciente do sofrimento do mundo. Nossos feeds de notícias online agregam toda a dor e crueldade do mundo, arrastando nossos cérebros para uma espécie de desamparo aprendido". E para conectar com tudo o que falei ali em cima, impossível não pensar na geração Alpha que cresce com todo o conteúdo do mundo na sua mão tendo que absorver a dor da mundo. É pedir demais de uma criança né?
Mas só para não acabar na bad, dá uma olhada nesse vídeo do Hermeto Pascoal tocando em um lago com outros músicos em Iporanga, em 1985.
Por hoje é só :~
Que ótima costura Débora.... fiquei pensando em muitas coisas... Me lembrei do artigo "It’s Time to Stop Talking About “Generations” sobre a concepção de geração. E concordo muito contigo sobre as poucas diferenças, mas vejo ainda algo muito diluído nas gerações atuais. (a gente sempre tá querendo ter caixinhas, e o tempo vem passando muito rápido pra isso).
e sobre meme...
queria te indicar esse site aqui https://mememanifesto.space/#!iceberg-top
achei massa a proposta de problematizar e pensar o meme para além da graça... tem algo mais por aí!!